sexta-feira, 2 de maio de 2014

LPN protege aves ameaçadas combatendo desertificação

In Diário do Alentejo, disponível emhttp://da.ambaal.pt/noticias/?id=1877#.U2QK9rw7fL8.gmail



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No domingo, 17, assinala-se o Dia Mundial do Combate à Seca e à Desertificação. Uma data que diz muito à região alentejana, duplamente fustigada pela inclemência do clima e por recentes más práticas agrícolas que culminaram na famosa Campanha do Trigo. E também um pretexto para uma visita ao Centro de Educação Ambiental do Vale Gonçalinho, quartel-general da Liga para a Proteção da Natureza em castro Verde, a partir do qual zela pela manutenção de espécies tão vulneráveis como a abetarda, o sisão ou o peneireiro-das-torres, e do habitat que partilham. A provar que conservação da natureza e combate à desertificação são duas faces da mesma moeda.



Texto Carla Ferreira Fotos José Ferrolho


Se hoje os Jogos Concelhios de castro Verde têm como mascote uma abetarda desportista, sinal de que a “rainha da estepe” continua bem viva e de saúde, é porque uma rara conjugação de esforços teve lugar há perto de duas décadas, impedindo a florestação com eucalipto de uma vasta área agrícola, então nas mãos da indústria do papel. Desencadeada por uma organização não-governamental, a Liga para a Proteção da Natureza (LPN), a intervenção teve a adesão dos decisores políticos, locais e nacionais, o apoio financeiro da Europa comunitária e mais tarde também o aval dos agricultores do Campo Branco, hoje mais de 150 envolvidos.  

Uma tão “invulgar” concertação de interesses que já por várias vezes o Plano Zonal de castro Verde, medida agroambiental elaborada especificamente para aquela região e em vigor desde 1995, “foi levado a Bruxelas como exemplo de uma muito boa ligação entre a conservação da natureza e a agricultura”, lembra a bióloga Rita Alcazar, coordenadora do Centro de Educação Ambiental do Vale Gonçalinho (Ceavg), a funcionar há 12 anos numa herdade a poucos quilómetros da vila de castro Verde. É importante não esquecer que praticar uma agricultura compatível com a conservação do património natural implica assumir compromissos que trazem custos adicionais aos agricultores, além de alguma perda de rendimento, que o Plano Zonal, enquanto instrumento financeiro, se propôs cobrir. 


É no Ceavg, um monte “ecológico” implantado bem no coração da estepe cerealífera alentejana, que a LPN tem montado o seu quartel-general a partir do qual zela pela manutenção de aves estepárias, espécies tão vulneráveis como a emblemática abetarda e os não menos carismáticos sisão e peneireiro-das-torres, assim como do habitat que partilham. Um trabalho já por diversas vezes premiado (projeto LIFE Estepárias), mas cujo reconhecimento maior é sentido na evolução, para o dobro e em alguns casos para o triplo, das populações ameaçadas. “Em 1997 tínhamos à volta de 400 abetardas na região e neste momento andamos nas 1 300, o que corresponde a cerca de 85 por cento da população nacional”, contabiliza a bióloga, orgulhosa, descrevendo as particularidades desta que está registada como a maior ave voadora da Europa: “Têm um comportamento social bastante marcado. São muito interessantes as paradas nupciais exuberantes que os machos executam para cativar as fémeas, logo no princípio da primavera”.

Num contínuo de quase 60 mil hectares de planície, uma extensão ímpar em território português e, muito provavelmente, também a nível do continente europeu, a região do Campo Branco oscila entre a produção de cereais e o pastoreio de gado em regime extensivo, o que “garante que estas aves aqui continuem a existir”, assegura Rita Alcazar. E, diríamos nós, quase com o estatuto de santuário nacional. É que, acrescenta a cientista, “esta é a comunidade de aves terrestres com maior proporção de espécies ameaçadas que nós temos em Portugal, e resulta justamente deste equilíbrio entre pastagens e cereal”. 


Está então justificada a segunda frente de trabalho da LPN em castro Verde. Além da proteção das aves, com medidas de que é exemplo a construção de torres para os peneireiros nidificarem (na foto), os “condomínios de luxo” como se lhes refere a brincar, há que pensar também na “conservação do solo”. Tanto mais por se tratar de uma zona de elevada suscetibilidade à seca e desertificação, cujos solos empobreceram significativamente, ficando ainda mais vulneráveis à erosão, depois da famosa Campanha do Trigo, a partir dos anos 30 do século XX. Daí que a própria LPN tenha optado por engrossar o número de agricultores que operam na região. Adquiriu seis propriedades agrícolas e, numa espécie de “campo experimental” com 1 800 hectares, tem proposto aos “colegas” soluções para promover a reversão de processos como a desertificação e a perda de biodiversidade, visando em última instância o desenvolvimento sustentável.  


Rita Alcazar exalta uma técnica inovadora no combate à desertificação, que consistiu na “injeção” de lamas provenientes da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de castro Verde em profundidade no solo, como forma de acelerar a formação do solo “em cerca de 10 vezes” e melhorar as suas características físicas e químicas. Medidas para reduzir a erosão do solo, como a sementeira direta, ou para minimizar o risco de seca, como o desenvolvimento de charcas e bebedouros ou uma maior preservação das linhas de água, têm sido igualmente testadas e sugeridas. 


Outro aspeto que não pode ser esquecido, dada a sua crescente expressão, é o ecoturismo enquanto alternativa de desenvolvimento local sustentável. “Há uma procura bastante elevada de turistas para observar estas aves no seu habitat natural e é um número que tem vindo a crescer, sobretudo de visitantes estrangeiros e na sua maioria oriundos do Reino Unido”, informa Rita Alcazar. O Ceavg funciona assim como polo de acolhimento destes “turistas altamente especializados, que sabem muito bem o que querem ver”. E que depois se espalham pelas unidades hoteleiras da região, usufruindo de outras ofertas patrimoniais e provando, como conclui a bióloga, que as “aves também podem trazer algum retorno financeiro”, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das populações locais. 


Se a desertificação é, como ficou declarado na convenção das Nações Unidas de combate ao fenómeno, “a degradação da terra nas regiões áridas, semiáridas e sub-húmidas secas, resultante de vários fatores, entre eles as variações climáticas e as atividades humanas”, então há pelo menos uma variável que pode ser controlada. Projeções assentes em dados climáticos (Atlas Climático das Aves Nidificantes na Europa, de 2007), indicam que o Baixo Alentejo poderá tornar-se “inadequado” para espécies como a abetarda e o sisão, que tenderão a migrar para norte. A coordenadora do Ceavg, pela parte que lhe toca, não arrisca cenários futuros. Prefere antes falar do que sabe e ser otimista: “Se nós conseguirmos continuar a trabalhar positivamente em termos de sustentabilidade, preservando o solo e minimizando o despovoamento, ou seja, na parte que nós conseguimos controlar, eu creio que conseguiremos manter este tipo de ecossistema e dehabitat aqui na região”.




Sisão

(Tetrax tetrax)

Vulnerável 

Em Portugal, a quase totalidade da população está concentrada
na região do Alentejo, com uma estimativa de aproximadamente
17 500 machos reprodutores.



Peneireiro-das-torres

(Falco naumanni)

Vulnerável

Em Portugal, o peneireiro-das-torres nidifica maioritariamente no Baixo Alentejo. A Zona de Proteção Especial (ZPE) de castro Verde alberga 80 por cento da população portuguesa.



Abetarda

(Otis tarda)

Em perigo

É a maior ave voadora da Europa, podendo os machos adultos chegar aos 14 quilogramas. No Campo Branco, a população de abetardas tem vindo a aumentar e, em 2011, registaram-se cerca de 1 300 aves que correspondem a cerca de 85 por cento da população nacional."

2 comentários:

Luizoca disse...

Olá Lora,

Gostei muito do teu texto e fico contente por existir em Portugal, neste projeto, a preocupação com o ambiente e a biodiversidade. Fiquei com muita vontade de visitar este monte e ver as espécies existentes e os cuidados que lhes são prestados por forma a preservar o ambiente em que vivem principalmente no que diz respeito á flora. Estes trabalhos são sempre muito importantes e fiz um paralelo com o projeto "Tagus Natura" levado a cabo pela Associação para a defesa e proteção do Estuário do Tejo. Este projeto encontra-se inserido na Reserva Natural do Vale do Tejo em volta dos rios Sorraia e Tejo e é muito importante para as aves marinhas uma vez que 100.000 aves passam aqui o Inverno. alfaiate, perna-longa, garça-vermelha e pequena, garça real, águia-sapeira, andorinha-do-mar-anã, flamingo, patos-reais, maçaricos, borelhos colhereiro, a gaivina-dos-pauis ou os patos (zarro, marrequinha, pato-real),etc.

à preservação destes ecossistemas é muito importante pois a biodiversidade é a fundação para um desenvolvimento sustentável por uma variedade de razões tais como:

Ajuda na diminuição de impactos ambientais.
Biodiversidade e ecossistemas providenciam recursos e serviços essenciais para a saúde humana que incluem nutrientes, ar limpo e água e regulam as pestes. A biodiversidade é essencial e é a base da medicina tradicional.
A Biodiversidade é a base dos eco sitemas e é muito importante para a industria moderna e para a agricultura em geral. A Biodiversidade tem um papel muito importante nas alterações climáticas pois contribuem para o sequestro do carbono. Tem também um papel importante na redução de riscos ambientais. Biodiversity also un- derpins

Bibliografia eletrónica:

http://elearning.uab.pt/mod/url/view.php?id=64153
http://elearning.uab.pt/mod/url/view.php?id=64164

florabiodiversidade disse...

Obrigada Luísa,

este projeto é mesmo muito interessante, e garanto-te que vale a pena visitar!

Espero por ti :)